segunda-feira, novembro 13, 2006

Dhyanas

Faz hoje uma semana que me aconteceu a coisa mais extraordinária de sempre. Estava a passar por um profundo desgosto. Li um pouco de um livro sobre budismo Zen. Uns momentos depois o meu estado de consciência mudou. Estava muito relaxado, todo o querer desapareceu e fiquei num estado de aceitação total. Os sentidos ficaram como que amplificados. Como se o contraste fosse realçado. Comecei a ouvir todos os sons, os pequenos desconfortos mostraram-se, a consciência corporal aumentou, senti uma pequena dor no pescoço que já lá estava. Havia um profundo contentamento. O reconhecimento de que tudo o que existe é o momento presente, aquilo que está realmente a acontecer tornou-se muito mais interessante que os usuais filmes mentais. Os pensamentos começaram a surgir um a um. E era um aparece solta, aparece solta, muito claro. Um deles era "isto está mesmo a acontecer" meio questão, meio afirmação. E outro "nunca vou conseguir explicar isto a ninguém". Também os usuais pensamentos recorrentes apareceram, mas não ficaram, vi-os claramente como ilusões, criadas pela mente para me afastar da realidade, do momento presente, que é única coisa que existe. E surge esta frase plena de significado "é preciso querer Ver, mas para ver Ver não se pode querer".

Foi como se uma película que turva a percepção tivesse sido removida, pela primeira vez. E parecia ver as coisas pela primeira vez. Como se nunca as tivesse notado. O estado era caracterizado pelo soltar, a atenção dirigia-se claramente a cada objecto, visual, auditivo, táctil, mental, para logo depois o soltar. E tudo era observado. Acho que isto pode ser comparado ao que acontece sob o efeito de álcool. Quando se bebe o estado de consciência muda, fica mais obscurecido. Foi como que ao contrário, como se tivesse andado com os copos a vida toda, e agora finalmente, tivesse ficado sóbrio por algum tempo.

Agora sei qual é a diferença entre compreender e Ver. Entendo que mesmo o Dharma é para ser soltado. Vejo claramente que é possível apenas estar, ser só presença, desperta. Viver mesmo o presente ganhou para mim outro significado. O budismo só interessa mesmo para isto. São indicações de quem despertou para nos ajudar a despertar. E despertar não é mais que ver para além do querer, é ver directamente, e não através de conceptualizações inclusive budistas. Claro que provavelmente o que acabei de escrever não faz nenhum sentido para muita gente. Talvez faça para algumas pessoas, para mim faz.

Falei com pessoas esclarecidas sobre isto e parece que é uma coisa natural. Estando num estado de maior receptividade é natural que se tivessem criado condições para isto acontecer. Este estado é aparentemente um estado de absorção chamado "primeiro Dhyana". Estados assim podem ser induzidos. Em retiros prolongados podem-se conseguir induzir intencionalmente. Eu não faço a miníma ideia de como repetir a "experiência".

Note-se que não estou a falar de uma coisa tipo "ah, hoje estou um bocadinho mais claro". Eu não sou muito dado a eventos extraordinários e experiências místicas. Mas isto é mesmo extraordinário e não há qualquer dúvida quando acontece.

Estive depois a ler sobre Dhyanas e parece que existem oito, sendo este o mais básico. E há pessoas que conseguem "entrar" em cada um intencionalmente, permanecer o tempo que querem e sair quando querem.

Decididamente, vou continuar a meditar e a participar em retiros.

4 comentários:

Avusa disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Avusa disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Avusa disse...

Quanto mais íntimo mais precioso.
Abraço

ISABEL Mar disse...

eu gostei especialmente do teu «novo» estado de espírito ...
um beijinho grande ...