Durante uns tempos procurei ajustar-me ao papel de
coordenador de um grupo budista Theravada. Aprendi muito com a experiência. A
tradição das florestas da Tailândia procura preservar os ensinamentos originais
do Buda e é uma fonte muito valiosa.
Agora que deixei este papel de coordenador budista sinto um
tremendo alívio. Estava a sufocar, a tentar ajustar-me a algo, a forçar algo. Demorei
muito tempo para perceber isto. Agora a minha respiração flui livremente, tem
outra qualidade. A sensação no peito é de abertura. Até voltei a ter vontade
de escrever neste blog.
Parece-me claro que, para algumas pessoas, a prática dentro
de uma tradição religiosa pode ser a melhor opção. É possível não sentir a
criatividade inibida, não sentir sufoco, mas pelo contrário, liberdade. Isso
vê-se por exemplo em alguns monges Theravada, que parecem tão serenos e livres
que até ficamos contagiados só de olhar para eles. Mas todas as pessoas são
diferentes e não há o melhor caminho para todos. As florestas decididamente não
são para mim… neste momento. Do Budismo fico apenas com a reflexão, a ética, a
meditação, essas coisas simples que a todos são úteis e conduzem à harmonia.
Mesmo dentro do budismo há tanta intolerância. É mesmo
difícil as pessoas verem que o caminho por que optaram não é o melhor do mundo
mas apenas talvez o melhor para elas mesmas. Então vemos algumas pessoas do Theravada
a gozarem com o ideal do Bodhisattva ou a dizerem que os textos do Mahayana não
têm realmente origem no Buda. E há pessoas do Mahayana a dizer que os do
Theravada seguem apenas os ensinamentos mais básicos do Buda. É estranho haver
esta bairrismo dentro do Budismo, onde supostamente deveria haver a tolerância e
abertura que o Buda ensinou.
Para uma pessoa que acredita em Deus ou que entrou em
contacto com o Divino, por muito avançado no caminho espiritual que esteja um
Budista, ele pode ser alguém que tem uma incapacidade de perceber a existência
de Deus… É difícil evitar o condicionamento excessivo do meio em que estamos
inseridos, mas é muito importante.
Uma coisa fundamental nesta vida parece-me ser a abertura e
tolerância. Aparentemente todos concordam que Deus, o Nirvana, a Ascensão, o
Indefinível, etc, não se pode definir por palavras. Então cada um tem a sua
linguagem e o seu modo de aproximação a esse indefinível, que também pode ser simplesmente
uma vida terrena com menos sofrimento e mais sentido.
Uns vão pelo caminho da sabedoria à procura das três marcas
da existência, outros vão pela compaixão, outros acreditam ser médiuns e
capazes de comunicar com a energia de Cristo… Não é preciso estabelecer uma
relação de ordem entre as várias opções e argumentar que a nossa é superior às
outras.
No fundo estamos mesma situação, caídos neste mundo, todos
juntos, toda a humanidade, todos os seres. Cada um com a sua linguagem, podemos
sempre dialogar, podemos sempre meditar todos juntos, se enfatizamos aquilo que
nos une em vez das especificidades que nos afastam.
Recordo-me da famosa resposta do Dalai Lama quando um
teólogo lhe perguntou qual é a melhor religião:
“A melhor religião é a que mais te aproxima de Deus. É
aquela que te faz melhor. Aquilo que te faz mais compassivo; aquilo que te faz mais
sensível, mais desapegado, mais amoroso, mais humanitário, mais responsável... A
religião que conseguir fazer isso de ti é a melhor religião...”